O Vasco e a transparência de dados: a torcida precisa saber o tamanho do buraco

quarta-feira, 19 de setembro de 2018
O que não faltam são motivos para condenar gestões recentes do Vasco da Gama. Um clube com história centenária ainda não sabe se já atingiu o fundo do poço por conta de presidentes e políticos irresponsáveis e medidas questionáveis em diversas áreas.

Mas uma das coisas que sempre me chamou atenção nessas gestões foi a falta de transparência nos dados financeiros.

Isso fica bem explícito em dois textos publicados por Rodrigo Capelo para a Revista Época.

Na primeira, lançada em 2017 - quando o clube ainda tinha Eurico Miranda como presidente -, o teor de alerta vem logo no título: "afundado em dívidas, um clube em estado de falência". A princípio, um pouco sensacionalista pra mim.
Mas o segundo parágrafo já vem como aviso para quem for ler o texto:

Eurico Miranda em 2018, chegando em evento na ALERJ
Foto: UOL
"Antes de nos aprofundarmos nos números, um alerta. Tudo o que você lerá aqui foi extraído do balanço financeiro vascaíno. Mas há razões para desconfiar do documento. A auditoria independente Anend, contratada por Eurico para verificar as contas de 2016, como manda a lei, expressou em seu relatório que não pôde checar todos os dados. Os auditores não conseguiram confirmar se havia dinheiro em caixa, por exemplo, nem uma série de outros indicadores cujos valores foram apresentados pela direção cruz-maltina. A auditoria avaliou as finanças com o que tinha e responsabilizou a administração do time pelo que viu, mas não pôde testar."

Dá pra enquadrar essa falta de transparência em muitos aspectos ruins. Uma falta de respeito absurda com o torcedor, que sustenta o clube através de bilheteria, assistindo na TV (cotas), consumindo produtos, sendo sócio, etc. e não pode ficar ciente da movimentação do seu dinheiro investido na instituição.
E além da questão moral, não tem como não pensar que algo está sendo escondido. A leitura do texto até o final evidencia que, talvez, o título da matéria não fosse tão sensacionalista e que o buraco talvez seja BEM mais embaixo. Em camadas do subsolo que ainda não são acessíveis a analistas econômicos, jornalistas... e muito menos para o torcedor vascaíno. Talvez apenas na deep web.

Um ano depois, Capelo publicou outro texto da mesma série: "obscuro e atormentado pela política, o gigante continua a apequenar". Nesse momento, o repórter já contextualiza a chegada de Alexandre Campello. O atual presidente do Vasco teve seus primeiros meses de mandato marcados por polêmicas em relação à venda de Paulinho para o Bayer Leverkusen. Isso custou um apoio político imenso - 13 vice-presidentes entregaram o cargo!

Paulinho e o presidente Campello
Foto: Paulo Fernandes/Vasco.com.br
Campello, à época, publicou um balanço e atribuiu certo valor ao mesmo: "em nenhum momento na história do clube tivemos um balanço que se aproximasse desse que publicamos. No balanço constam os valores da venda do Paulinho, as comissões, tudo. Dando total transparência à venda do jogador".

Bem, em seu texto, Capelo não discorda por completo. Copio e colo, mais uma vez, trechos da matéria dele:
"Campello talvez tenha razão na comparação com balanços anteriores, produzidos pela diretoria do ex-presidente Eurico Miranda. O seu balanço apresenta mais dados do que o mercado está acostumado a encontrar. O que não quer dizer que o clube tenha conseguido nem sequer chegar perto da transparência necessária e prometida. [...] Basta virar mais uma folha para que se chegue ao relatório da BDO, justamente aquela que Campello citou como motivo de credibilidade para o balanço, para que o discurso escrito pelo cartola nas páginas anteriores vire um ponto de interrogação. [... (não vou entrar muito nisso porque o texto já tá longo pra caralho)] O quadro fica pior com o que a auditoria descreve a seguir. Este é um trabalho que funciona do seguinte modo. O clube diz que deve tantos milhões para o governo em impostos não pagos, e a auditoria avalia, a partir das documentações fornecidas por ele, se os números informados estão corretos. Isso não existe no Vasco. A BDO descreve que, até a data de sua publicação, não tinha sequer recebido da diretoria vascaína as documentações necessárias para validar as demonstrações."

Como se não bastasse, para evidenciar ainda mais a falta de transparência no clube, ontem foi divulgado relatório da Análise Itaú BBA, que anualmente, avalia a saúde financeira dos clubes brasileiros. O site GloboEsporte apurou as mais de 200 páginas e fez uma análise para cada clube.

A análise do Vasco já começa com o subtítulo "Relatório que detalha saúde financeira do futebol brasileiro critica 'qualidade ruim das informações' prestadas pelo clube em 2017".

E continua: "De acordo com o estudo, o fluxo de caixa do clube é 'muito difícil de ser fechado' por conta do problema com as informações, além de 'inúmeros ajustes, reclassificações, ressalvas'. Por isso, concluem os analistas do Itaú BBA, é possível 'apenas ter uma ideia' da real situação do Vasco. [...] 'A auditoria encontrou tantos problemas nas informações prestadas pelo clube que se absteve de dar parecer. Isto é uma forte indicação do tamanho do problema que o clube enfrenta'".

Como já argumentado, a falta de transparência é uma completa falta de respeito com os torcedores vascaínos, que apesar do momento ruim, não abandonam de forma alguma. Ele próprio não pode mensurar a real situação que seu time do coração está. Além da cortina que isso pode estar sendo para acobertar sabe-se lá o quê.
Talvez o que eu ache certo seja o Campello convocar uma coletiva para dar uma de Márcio Braga. "ACABOU O DINHEIRO". Que seja. Pelo menos, com os dados à disposição, fica mais claro à torcida, ao eleitorado vascaíno, a jornalistas, analistas econômicos quais medidas evitar e quais tomar para as futuras eleições.
Mas, apesar dos indícios das matérias, fico na torcida para que esses inúmeros problemas enfrentados pelo Gigante da Colina não sejam tão graves assim e que o clube volte, de fato, a figurar nas cabeças.

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